controvérsias

"A cada mil lágrimas sai um milagre”

Alice Ruiz

sábado, 3 de janeiro de 2009

Carmen por Carmen

A Alice é uma doida grosseira. Não sei como a Chris aguenta. A Chris tá ali, fazendo o melhor possível, a Alice já chega empurrando e sai no tapa: "Deixa comigo!" E a Chris deixa... fica olhando de um canto quase desolada. Eu jamais deixaria essa louca escandalosa fazer qualquer coisa por mim. Vou lá, fico pertinho da Chris, abraçadinha nela. Sabem, eu dou um boi pra não entrar numa briga e uma boiada pra sair correndo de uma. Eu sou triste e a Alice me detesta. É que tudo dá errado pra mim, mas eu não acho que tenha que revidar ou consertar ou qualquer coisa assim. Porque vai dar errado de novo. É uma sina minha. Nem tento mais ser diferente. Pra quê? Pra chorar mais ainda? Pra ficar além de triste e sozinha, toda doída de tanto apanhar? Nanananina. A Chris me entende e fica comigo nos dias mais tristes. A Alice? Vem chegando, dando tapa nas costas e gritando: "Sai dessa, Carmen, vamos sair pra dançar, rodopiar pelas avenidas, beber todas, paquerar todo mundo!". Eu não gosto dessas coisas. Ficar se expondo inutilmente por aí e depois fazer coisas que a gente nem lembra direito se fez ou não. Ui. Quero não. Eu quero mais é ficar conversando baixinho, de preferência embaixo das cobertas, longe da luz do sol e de janelas bem fechadas. É que o mundo me assusta. É tudo tão agressivo. Quando tenho que sair - ai! - vou encolhida, rezando pra que ninguém me veja. Morro de medo de ser agredida e quase sempre sou. Um olhar mau humorado, uma cara safada demais, e quando gritam: "Ei!" Ai. Dói meus ouvidos, dói na minha alma, já saio correndo, volto pra casa, pego a minha gata de pelúcia e me enfio embaixo da cama. Como podem ficar falando alto desse jeito? Minha cabeça fica rodando, o barulho é insuportável, porque não mais baixo? Ou menos, pelo menos.
Não me dou bem com as pessoas. Mentem demais, tem um jeito cheio de joguetes, e pra quê? Seria tudo tão mais fácil se a gentileza imperasse, se as palavras mais duras fossem ditas do jeito mais doce.
Ó, é só lembrar do lado de fora da minha casa que eu já começo a chorar. É muito escuro tudo. Não é o escuro da lua, é o escuro dos corações. Machuca. Espinha. Por causa disso, mesmo doendo, prefiro ficar sozinha. Dói menos. Dá pra esquecer que o mundo existe, que o coração existe e o melhor: dá pra esquecer que eu existo.