controvérsias

"A cada mil lágrimas sai um milagre”

Alice Ruiz

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

os bacuris da árvore

Ontem foi realmente um dia extraordinário, não só pela tarefa que impliquei em fazer: queimar antigos poemas, cartas de amor, textos e textos de uma xeroteca pouco usada... currículos antigos, fotos amareladas, borradas... projetos nunca realizados... uma limpeza profunda. No meio dessa coisa toda, num dia que fez um calor terrível - um sol de rachar - na beira da churrasqueira de tijolos empilhados, já na tardinha, chega a vizinha amigaça Helen para o café, quando...
- Chris, você tá ouvindo isso?
Isso era um grito de pássaro, o Anu, se não me engano, que tava ouvindo desde a manhã cedo.
- Não é Anu, não, Chris, isso é miadinho de filhote.
Caraca! Fiquei prestando atenção e de fato, o grito do pássaro se transformou em miadinhos desesperados, coisa que eu não podia imaginar. Começamos a procurar a origem dos gritinhos na mata ao lado da minha casa, no terreno de outro vizinho. Quanto mais perto a gente chegava, mais nítido se tornava meu engano terrível e embaixo de uma bromélia gigante foram aparecendo manchas pretinhas se mexendo e rabinhos que ficaram do lado de fora da planta protetora. Quatro. Achamos quatro filhotinhos e que não eram de gato, não. Quatro filhotinhos de cachorro recém nascidos. E mesmo com eles na palma das nossas mãos, os miados/ganidos não paravam.
- Tem mais, Chris, mas onde estão?
Porque olhei pra cima, não sei, só sei que olhei. E vi. Um saco plástico azul de supermercado pendurado na árvore, balançando mesmo sem vento. Tirei o saquinho lá de cima e alcancei pra Helen que encontrou mais três filhotinhos. Dois mortos pelo excesso de calor e desidratação e uma menininha toda pretinha, viva, da metade do tamanho dos outros.
Nessas horas perco completamente a fé no ser humano. Fiquei com tanta raiva, mas tanta raiva... como queria encontrar o cara que fez isso, amarrá-lo dentro de um saco plástico e deixá-lo sem água nem comida pendurado numa árvore embaixo desse sol de verão. Ah, como queria.
Levamos para a minha casa, colocamos dentro de uma caixinha de papelão com uns paninhos e começamos a telefonar pra todo mundo, em busca de uma cadela mãe que pudesse adotar os pequeninos, ainda com umbigo e de olhinhos fechados. O veterinário da nossa comunidade, Dr. Luis, começou a dar dicas de como cuidá-los até que o interrompi e exclamei:
- Doutor, nós estamos numa fase meio complicada, contando os centavos, como vamos comprar leite para cachorro recém nascido?
- Não te preocupa, Chris - responde o doutor - vai na agropecuária e põe na minha conta.
Lá fui eu. Depois, numa farmácia, que doou as seringas que estamos usando para amamentá-los. Chego em casa, arrumo as coisas e quando me viro, encontro essa cena: E desse jeito, voltei a sentir alguma fé no ser humano.