controvérsias

"A cada mil lágrimas sai um milagre”

Alice Ruiz

quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

e que venha 2009!

... em bifes.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Hora da folga

Um tempinho vem bem. Tempo de festa, de reencontros, de despedidas. Volto em poucos dias e peço a todos que se divirtam. Muito. Um abraço e, obrigada mesmo por curtir esse espaço que cuido com todo amor. Mesmo quando às vezes, rima com dor.

Um feliz Natal pro Papai Noel também

Pra ninguém reclamar que não falo muito do Natal...

sábado, 20 de dezembro de 2008

Distraídos venceremos

O piquenique

- Vocês sabiam que o homem se acha o topo da evolução na natureza da Terra?
- De que jeito?! Não brinca!
- Sério? Só porque ele domina tudo na base da violência?
- E ainda acha que consegue explicar o que existe ao seu redor...
- Nossa, que bobagem.
- E ainda pensa que é o único inteligente no universo!
- Quanta pretensão...
- Tolinho...
- Passa um pedacinho da pimenta rosa?

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Uma Menina Sim, ou, Uma Menina Zamzen

(pra vc, Benter)
Era uma vez uma menina sim. Tudo que ela ouvia, tudo que perguntavam; tudo ela entendia, tudo ela dizia sim. Ninguém nunca sabia quando era não, quando era talvez, quando era sim mesmo. Quando ela respondia sim – e ela sempre respondia sim – seus olhos reviravam e não davam a dica necessária para entender se ela entendia, como entendia e que resposta daria. Na expectativa do silêncio após o sim, nada vinha. Uma quietude cheia de sim. Percebia o mundo e a vida assim, dizendo sim.
Mas, seus sins tinham que ter um fim. Assim - só dizendo sim - o único jeito era ver o que acontecia, pra onde ia e o que fazia. Seguindo a menina, viram claro seu jeito amável, ponderado, olhar de lado, um jeito de sempre dizer sim: ela nunca fazia o que dizia que sim, faria. Ah, sim, às vezes, sim, ela fazia o que dizia que sim, ia fazer. Mas ela nunca dizia o que ia fazer, ela só respondia que sim. E todo mundo continuava sem saber o que aquela menina sim queria, quando dizia sim. E num repente, cansada de ser perseguida para saber se seu sim era sim ou não ou talvez, ela decidiu, finalmente, se explicar: “Sim, eu só faço”. A partir daí, todo mundo entendeu a menina sim que nunca se sabia se entendia ou queria ou não queria. Ela só fazia.
A menina sim dizia sim e só fazia o que tava a fim.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

O Natal de Alice

Dingobel, dingobel, não tem mais papel... e todos os dias tem nascimento. Das corruíras, dos gatos, das árvores, da saladinha de tomate. Todos os dias, nasce uma amizade, um amor, uma flor. Todos os dias a família universal cresce. Somos todos primos.
Todos os dias rego, caço, animo, escrevo, rezo. Todos os dias amo meus amores. Todos os dias amo a maresia. Todos os dias levanto querendo ser melhor. Bebendo um vinho, fumando um cigarrinho, que meu critério tá dentro. Todos os dias tem livro no balcão, tem conversa de botequim, tem silêncio sagrado, tem bolo de aniversário.
Tudo que é sagrado está no céu, na terra, no fogo, no ar. Tudo que como é sagrado: carne, bolo, rúcula e beterraba - ui! Todo amor é sagrado. Todo deus e deusa que respeita, deve ser respeitado. Todo amor é pleno. Vivo.
Todos os dias é festa, confraternização, nosso café da tarde.
Saúdo o dia e sou saudada por ele, desejando saúde, fé, coragem, ao universo de todos os seres: ets, seres do passado e do futuro, os seres da transparência, os que sopram no ouvido, toda a natureza, essa, que conhecemos e a quem devemos nossa existência. A natureza, essa, que desconhecemos e que nos inclui.
Todos os dias eu sou eu, eu sou nós, eu dou nós, bato na parede e grito. Porque todos os dias quero viver. Com mais amor, com mais ardor, com mais luz, e o que resume meu grito: sempre amor.
Nenhum dia não é feito para amar, brincar, dar atenção, estar presente, dar presentes.
Nada é mais especial do que todos os dias. De chuva, de sol, de tristeza, de sal, de Teresa, de todos nós.
Nada é mais sagrado do que todos os dias.
(Cristo morreu por nós há quase dois mil anos e até hoje carregamos essa culpa)

domingo, 14 de dezembro de 2008

sábado, 13 de dezembro de 2008

Alice e a dor

Dor provoca raiva
Raiva disfarça a dor
Dor dá raiva
Raiva da dor

Achismos

Também tenho os meus, e quando me dou conta, aiaiai, morro de vergonha. Os achismos vem da idéia que “minha opinião é minha e ninguém tasca”, “eu penso assim, e daí?”. A segunda frase é a minha predileta.
Esse texto foi inspirado em uma comunidade que apareceu na minha frente no orkut. Uma coisa tão sem sentido, tão redundante e obviamente ridícula, que me fez parar pra perceber os achismos alheios e os meus próprios. Até onde nossos achismos nos impedem de se relacionar com os outros? Essa pergunta parece um tanto estúpida. Achismos são idéias radicais expostas como se todo mundo pensasse assim, como verdades universais. Ai, maldito senso comum. Legitima as coisas mais estranhas e agressivas. Legitima julgamentos, absolvições e condenações.
O politicamente correto, por exemplo. Sobrevive quem pensa e o pior, acredita ter atitudes “corretas”, atitudes “justas”. Legitima seu óbvio egoísmo em cima de idéias comuns e... “corretas”. E se alguém não sente do mesmo jeito, não está sendo... “correto”.
Sentimentos pra mim são o que valem. É meu achismo mais profundo. Por isso me dou o direito de não ser “correta”, mas de ser “verdadeira”, o que são apenas achismos diferentes. Mas igualmente vazios.
E precisamos mesmo escolher achismos para ter uma direção de vida? E quem se recusa a ter achismos, ou seus achismos mudam com a freqüência do estado de espírito volátil, sobrevive?
Ter “razão” é outro achismo absurdo. O que mais odeio, mas ai de alguém que diga que “não tenho razão”. O achismo da “razão” é o orgulho que impede as pessoas de se relacionarem com respeito às diferenças, impede a compreensão. Será a compreensão outro achismo também?
Ah, sim. A comunidade que citei busca pessoas que se identificam estarem incomodadas com outras que dizem que vão mudar e não mudam. São elas tão incapazes de perceber que “mudar o outro” por uma “razão” “politicamente correta”, que mexe com sentimentos “verdadeiros”, tornando a convivência insuportável, algo absolutamente inviável? Quem pensa que o outro tem que “mudar”, não vê que seria mais fácil buscar um outro diferente, ou mesmo mudar a si mesmo. Mas se vê com “toda a razão”, pautada no que mesmo? No “correto”.
Ainda prefiro viver no que é “verdadeiro”. Escolha de razão, escolha de direção, escolha de achismo.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Lançamento da 2ª edição de Eu não Entendo

A todos que participaram ativamente, discretamente ou somente na torcida, muito obrigada. A festa foi linda, tudo de bom, muita harmonia e beleza.

As fotinhos estão aqui www.chrismayer-livro.blogspot.com

A produtora, amiga, que segurou a onda, os atrasos e fez com que tudo fluísse naturalmente: Monika Seabra.
Os músicos que encantaram: Boêmios, meus Boêmios.
A performance generosa e linda: Helen Ferreira.
A fotógrafa generosa que documentou todo o evento: Clara Rosson.
O lugar que acolheu a festa: Café Matisse.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

A esperança de Carmen

O dia mais lindo da minha vida foi o dia em que eu acreditei.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

É Hoje....

Alice "citando" Fernando Pessoa

O amor que me segue não desconhece aquele que você nega, por isso aceite você e me deixe em paz!

domingo, 7 de dezembro de 2008

Na hora

sábado, 6 de dezembro de 2008

O coração de Carmen

Esse desenho é do meu primo Bubi. Encontrei numa pasta de cartas, flores secas, cartões afetivos, essas coisas. Viajamos juntos em 1980, num barco pelo Mato Grosso. Enquanto o resto da turma pescava, nós dois sentávamos na areinha, bem na beira do rio, para tomar o antimalárico recomendado por ele: uísque caubói. Conversávamos muito, sobre coisas que até hoje eu não entendo. Mas a gente se gostava. Botei umas corezinhas, tá, Bubi?

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Decisão

Tudo que o amor ensina,
É o que o amor ensina.
(basta saber se queres amor
ou dor)

Tracy Chapman em astral Bob Marley

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Rebeldia (2005)

Axônio manda. Dendrito recebe. É a lei da comunicação neuronal. Nunca se encontraram, nem se viram uma única vez. Axônio mandando e Dendrito recebendo. Sempre.
Enquanto Axônio dá, Dendrito ganha. Axônio envia, Dendrito pega. Axônio atira, Dendrito....
- Dendrito?
- Essa não! Isso daí, não quero, não.
- Como não quer? Você não tem querer, tem que pegar!
- Essa coisa? Nem pensar!
- Você não pensa, você recebe!
- Não, não e não.
Arma-se uma grande confusão na sinapse, neurotransmissores se alvoroçam confusos e apavorados, sem saber o que fazer com a informação desprezada.
- Leva de volta! – grita o insultado Dendrito.
- Não posso! - exclama Axônio, que só sabe dar.
- Então aprende, porque esse negócio daí não recebo mesmo!
Uma ala urgente de peptídeos aparece em meio ao tumulto, ameaçando severamente Dendrito, amarrando seu terminal:
- Engole! – vociferam.
Sem chance de quebrar a lei da rede neuronal, Dendrito engole o sapo inteiro. Humilhado. Devastado. Quimicamente derrotado.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

E o céu alinhado de Alice chorou

Prefiro

tua raiva
à tua
pena
sem letras

domingo, 30 de novembro de 2008

sábado, 29 de novembro de 2008

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Alice e o silêncio

E é mais saudável que o silêncio. O silêncio indica rompimento, lista negra. O silêncio diz que algo aconteceu que fez de você uma criminosa. A questão é que você só sabe do silêncio, mais nada. Sabe que tudo foi dito, em algum lugar, longe de você, e que provocou esse círculo de silêncio. O silêncio é uma grande covardia, porque a gente também sabe que o grupo que se fortalece através do silêncio, tem medo de descobrir que o que tanto elegeram e legitimaram entre si possa não ser verdade. E o silêncio é a grande arma de quem planta a discórdia. Porque se garante que tudo que foi dito não sairá do grupo, que decide, por conta ou por medo de também ser silenciado em algum momento, silenciar. Porque o silêncio é tirano. É uma forma de manipular e dominar e esconder o seu erro, a sua culpa ou mesmo o seu amor. Porque é baseado em mentiras que foram “verdadeirizadas” pelas palavras francas do que sofre pelo silêncio dos outros. E o grupo assume a verdade de um ou alguns e silencia frente ao suposto pecador. O silêncio é uma grande covardia, porque o que se expôs e argumentou ficou nu diante de uma platéia muda e armada. E fica, por conta do amor e da neurose natural, especulando sobre o que terá provocado o silêncio. Sabe, talvez, supõe, até prevê, mas não tem chance de se defender. Não tem chance de dizer o que sente, de dizer o que pensou, quais os enganos que porventura cometeu, quais as interpretações errôneas. Fica esperneando, sozinho, isolado, desprezado, literalmente. Nem seu choro, nem sua mágoa, aparecem. Os que decidiram pelo silêncio, decidiram em nome de palavras muitas vezes dita por apenas um que pede suporte, que pede ao grupo que fique ao seu lado numa briga que não existe. E ninguém pergunta. Ninguém pergunta por que tanto quanto quem foi desprezado, tem necessidade de sentir-se pertencente ao grupo, então, nem vai questionar. Vai silenciar junto com os outros, acabado de medo que descubram que ele também pensou de um jeito agora desprezado. Acabado de medo por perguntar-se, mas afinal, o que tanto de errado fez o que foi afastado pelo silêncio, será que é mesmo assim? E para que sua culpa e dúvida não apareçam, faz silêncio junto com todos. E por medo de ser silenciado, silencia. E nesse silêncio o grupo sente-se fortalecido. Sente-se mais unido porque se juntaram para que alguém pague e disfarce todos os medos. Mas é uma ilusão. Uma ilusão tão clara, porque é uma união feita de medo e culpa. Tão frágil. Tão triste. Aos tiranos que usam do silêncio, só me resta sentir pena. Porque escolheram o medo e não o amor.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Para me conhecer melhor

Pela internet, despejaram desejos em cima da minha vida. Adoro como vivo, sem dúvida nenhuma. Mas não é o paraíso, nem tenho tal pretensão. Foi uma escolha, preço caro de pagar, mas não me arrependo nem um milimetrozinho sequer. Não é nada romântico, nada heróico e nem nada isolado demais, tanto que tenho internet conectada 24 horinhas...

Moro em Florianópolis, na região sul da ilha, dentro do Parque Municipal da Lagoa do Peri

Mais ou menos 5 anos atrás aluguei uma casinha no final da rua. A última casinha, de madeira, cheia de frestas, onde convivia com corruíras, sapos, aranhas, saracuras, tucanos, aracuãs, gralhas azuis, meus cachorros, cotias, cobras e ratinhos do campo. Inevitável, tempos sem grana nenhuma. Tempos de depressão também. Fui para tentar me encontrar (comecei a achar ridículo esse negócio de se encontrar, como "se encontrar", se estou o tempo todo aqui? Nenhum espelho me evita...).

Como a última casa, tinha na minha beira a mata selvagem do parque, intocável, com uma trilha muito procurada por estudantes e turistas. Trilha muito antiga, feita por escravos, que cruza a ilha do mar aberto até a baía. Essa trilha passa por uma cachoeira com uma piscina incrível e mutucas insuportáveis. Seguindo além, chegamos até os poucos alambiques do sertão do Peri, resultado das ruínas de engenhos de farinha de mandioca. As fazendas de outrora, do outro lado dos morros, foram abandonadas no séc. XIX.

Nessa casinha, feita de uma peça grande e alta, cheia de janelas improvisadas, com um mezanino de quarto, mergulhei, surtei, ressuscitei. Tinha uma hortinha com rúcula, rabanete, alface e tomatinhos. Catava lenha todos os dias para o nissin miojo com ovo e café de cevada, até que... um dia choveu e fiquei sem nissin, sem café e aprendi a guardar lenha seca... Depois, aprendi a pescar, descobri que espinafre nasce na beira da praia e que os abacateiros das ruas são extremamente generosos com seus frutos suculentos. O vizinho tem um pomar de caqui que nós colhemos só o que comemos. E peixe com limão feito na churrasqueira passou a fazer parte do meu almoço naqueles tempos.

Todos os dias de sol, no anoitecer, naquele lusco fusco cheio de cores, via as fadas dançando sobre as águas rasas e limpas da lagoa. Na beira da mata, vinham seres encantados curiosos de mim, e fizemos uma amizade silenciosa. As saracuras vinham todos os dias roubar a ração dos cachorros, assim como as cotias, que, cuidadosas, se jogavam na água, perseguidas pelos meus bichos. Ali vi cachorro fazer amizade com potro, cobra não picar por decisão sua e não falta de oportunidade, ouvia a lagoa sussurrar todos os dias suas mazelas e alegrias. Vi gnomo levar susto de perceber que eu o vi, ou talvez ele tenha levado um susto do meu susto. Saímos correndo para lados opostos, os dois bobos.

Lá o tempo passa no seu próprio ritmo, não sei quais os critérios, mas tem outro tempo, às vezes muito rápido, às vezes tão lento que uma horinha parece ser 3 ou 4 horas. E às vezes, uma hora parecem minutos. Foi tudo de bom e tudo de ruim ao mesmo tempo. No anoitecer, chegava em minha casa o cheiro da dama da noite acordando, inundando minha alma de fantasia. Ao lado da casa, uma árvore de contos de fadas, toda retorcida, uma árvore perigosa, cujos frutos são mortais e as flores alucinógenas. Uma datura, trombeta de anjo, com suas flores brancas, caídas, poucas folhas verde claro. Embaixo dela nada cresce e nenhum animal se aproxima de sua pouca sombra. Conta a lenda que quem descansa embaixo dela, esquece uma boa parte de sua vida. Além da lenda da lagoa, que diz que quem bebe a água da lagoa, sempre volta, e eu brinco que bebi água demais e não vou embora nunca.

Fiquei três anos. Depois a dona me mandou embora para aumentar o aluguel bem mais do que o índice oficial (prática comum aqui) e, sempre dentro do parque, pulando um bom tempo de casa em casa, parei em um terrenão cheio de pitangueiras, aroeiras, capim, unha de gato, rosetas, girassol e hibiscos, onde aparecem os sabiás laranjeiras, as corujas, gaivotas e urubus sinalizando a morte de algum bicho desgarrado.

Bem na beira do mar e com uma outra casa no mesmo terreno, onde moram meus melhores amigos. Nossos vizinhos ficam bem distantes, temos uma privacidade visual e auditiva plena e o mar é nosso quintal. Barulho de mar, barulho da avenida também. A praia aqui é vazia, areia muito fofa impede os caminhantes e o mar muito bravo afasta os nadadores. A energia aqui é muito outra, porque o vento sopra gigante o tempo todo, afastando o silêncio e impedindo a criação de raízes internas e externas.

Mas é tudo muito perto e a lagoa é visitada com bastante freqüência. A praia da Armação fica mais ou menos a 1 km de distância com uma infra simples e suficiente (leia-se mercadinhos, fruteira, farmácia, vídeo locadora, restaurantes de verão, lojinha de 1,99, caldinho de cana). O centro de Florianópolis fica a 25 km daqui, atravessando inúmeros bairros.

Aqui gosto de dormir ao relento, na beira do mar. Gosto de viajar nas estrelas e na profundidade do céu. Tô mais perto da arte (e a minha é digital, olha a contradição). E as baleias nessa época do ano, que nos trazem vaidade, tristeza, curiosidade, tranqüilidade e muita beleza. Ontem morreu um filhote de 2 toneladas preso numa rede de pesca. E chegaram mais 5 mães com seus filhotes na nossa praia, com o esfriamento da água.

Essa é nossa maior diversão de inverno, assim que chega baleia a comunicação via telefone e bicicleta enche a praia de gente. A lua cheia nascendo no mar também é uma grande festa. A praia fica cheia e o silêncio é incrível. Um ritual quase mensal (às vezes nubla tudo) fantástico.

Não temos televisão, não nos interessam as políticas internacionais ou nacionais (ninguém vota da nossa tribo), olimpíadas para nós é uma viagem surreal da competitividade humana e nossa maior arma é o mutirão. Nossos dias são preenchidos com mar e poesia, pão e sal e muita música, fotografia (minha profissão) e conhecimento. Nossos interesses são da alma e construímos um ritmo de observação de tudo: através das formigas tenho a previsão do tempo e se o dia vai ser tranqüilo, perigoso ou agitado. E os cuidados com nossos animais (4 cachorros e 6 gatos, entre as duas casas). É incrível, mas ontem mesmo aconteceu algo mágico demais. Nosso pequenininho, mais recente gatinho de 6 meses, o Tuti Tutankamon, chegou com um troféu para me dar de presente: um ramo de flores. Rimos muito com o romantismo e carinho desse gato que é tudo de bom. É o mais popular de todos, consegue fazer amizade com todos os cachorros e gatos, que entre eles, tem suas brigas, suas diferenças, se dão com uns e não se dão com outros, e assim vai. Mantemos nossa vida, nosso ritmo e nossas prioridades com muito custo, porque o social e a questão financeira vivem nos empurrando para onde não desejamos ir. Odiamos lugares como shopping center, mas amamos um ótimo vinho.
A praia da Armação não tem meninos de rua, não tem ninguém morando na rua, com exceção do Alexandre, um garoto que tomou chá de trombeta e não voltou mais da viagem e fica perambulando por aí. Todos cuidam dele, dando comida, banho eventual e roupas.

Temos nossas pragas como bichos de pé, carrapatos, bernes e bicheiras. Temos gatos e cachorros de rua além da conta e cada ninhada é um super problema. Castramos tudo o que dá, porque não conseguimos manter essa bicharada da rua. Nossos animais são absolutamente livres, não temos um jardim fechado e eles passeiam a vontade e voltam quando querem. Nossos eletrodomésticos também sofrem muito e logo estragam pela maresia próxima e as constantes quedas de luz.

Nossa tribo não dá valor ao trabalho, ao sucesso profissional ou a riqueza. Valorizamos a generosidade, o conhecimento, a solidariedade, a qualidade dos fazeres. Isso não significa que a gente não trabalhe, pelo contrário, trabalhamos o tempo todo, buscando uma ponte com o “mundo dos homens” (é como chamamos o mundo dos negócios, do comércio excessivo, do centro nervoso, da economia como prioridade antes do ser humano, das relações de trabalho, das relações de perversidade social, representação social antes do ser, dos conceitos que julgam, mas não perguntam). Mas sem nos violentar, peça qualquer coisa para mim, eu faço. Mas não me peça para ser desleal, para ser infiel com os meus sentimentos, com a minha ética extremamente rígida. Não me peça para matar, competir, vestir o que não posso (fico ridícula num tailler). Não me peça para não oferecer carona, casa, comida, carinho, só por desconfiança. Não me peça para dispensar meus amigos e visitantes eventuais por falta de tempo. Tenho meus vícios antigos, fumo um maço de cigarros por dia e adoro uma coca cola. É meu paraíso, meu inferno, é minha vida, escolhida e construída. Por isso sou feliz. Por isso mesmo na tristeza, ou na eventual loucura, ainda assim eu sou feliz. Mesmo com sobrepeso, sem independência financeira, ainda assim, eu sou feliz. Não vai durar eternamente, tudo muda, inclusive nossos desejos. Tenho um sonho capaz de me mover daqui, mas jamais voltaria a um apartamento ou a uma cidade grande, pois seria a morte em vida minha. Nossa maior batalha, nosso maior desafio, é ser a cada dia uma pessoa melhor, é compreender cada vez mais o outro, é querer ver nosso entorno feliz.

domingo, 23 de novembro de 2008

Esses gens...

Eu quero... (2005)

Um pedido de uma amiga amada: "Eu quero um balão com duas pessoas voando num pôr-de-sol com um chão de estrelas."
Mais um sonho realizado através da fotomontagem, ou se preferirem, através da fotopoesia.

As visões

Tem gente que tira fotografias da gente que a gente nem sabe como foi. Ou até sabe, mas não imaginou o resultado. Olha para a foto e pensa: "Nossa, ou a fotógrafa conseguiu ver algo que eu nem sabia que existia em mim, ou ela transformou algum "mim" nessa foto, ou quem sabe fantasiou esse "mim" que não sou eu, ou, talvez, tenha me transformado em alguma coisa durante a sessão de fotos." A dúvida permanece.

Katherine Funke, vc tirou fotos minhas de uma forma tão bonita e particular. Obrigada.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

A Feira

Participar de uma feira com minhas fotos, meu livro e tendo em frente uma fazendinha com minipôneis e minivacas e minitouros, não é mole não. Das coisas boas - que são as que interessam - é que o pessoal curtiu o meu trabalho. Muitos contatos, troca de idéias e a venda gostosa do livro de fotopoemas "Eu não Entendo". Que foi, com muito orgulho e alegria, pra segunda edição. Prontinha na semana que vem.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

A tristeza de Alice

Você não responde. Fui trocada por outro ouvido talvez mais apurado, talvez mais irritante, talvez mais elegante. Talvez de olhos e carne. Quase soluço. Quase desisto. Quando ouvi que partes são queridas e partes não, me senti num açougue. Pendurada em esquartejamento. "Aquilo eu gosto, ah, aquela parte ali, não, não gosto. Aquela outra, mais ou menos." E assim, partes minhas são empacotadas e levadas para casa. As outras, rejeitadas, se mantém penduradas a espera de alguém que goste, ou! de alguém que acha que não merece levar um pedaço meu melhor.
Quando você não gosta, silencia. e me dá medo. E ouvi de outro você que "quando dá medo, já era." Mas medo tenho sempre, bem... já era. E nunca vai de verdade, porque toca naquele pedaço do coração que é puro amor. Um coração que foi levado inteiro, mas comido aos pedaços. Devorado nobre sobre a mesa em um picadinho sem molho.
Você não espera. Não dorme. Tem um oco em seu coração que é uma dor que pesa muito. Faz você se encurvar sobre a tela. E eu choro. Porque conheço os ocos, conheço os pesos, e claro, nunca sei as medidas certas. Você mente quando diz que diz a verdade. Você não conhece a verdade. E, quiçá (adoro essa palavra. Quiçá. Soa bem, soa kissá, soa a relatividade atenta de mim), e quiçá, alguém conheça talvez algo parecido com uma verdade. Afinal de contas, a própria palavra tem plural. Porque verdade tem plural. Verdades. Diz ainda de longe mais um de todos os vocês que "quem diz que a verdade é um pacotinho embrulhado pra presente?" Porque não todas, muitas, várias, algumas, possibilidades? Verdade aberta. Cheia de frestas por onde entra a água cantarolando de sua voz molhada. De seu rosto marcado de vida. De seus olhos salgados.
Você não. Não deixa, não ouve, não ama, não mata, não cutuca, não responde.
Eu sei. É só pra mim. Que é assim.

domingo, 16 de novembro de 2008

Desenho e Formigatura

É... um dia, nosso professor de fotografia nos perguntou se sabíamos desenhar, no que prontamente respondemos: "Se a gente soubesse desenhar, não precisaria fotografar." Soube ali, que virei fotógrafa pela nobre frustração de não ter a habilidade do traço.
Claro que meu conceito sobre fotografia e fotografar mudou rapidamente. Percebi as diferenças, as características e as possibilidades de cada manifestação, de cada maneira de se expressar. Seja ela qual for.
Mas... o photoshop - e isso é bem recente - novamente realizou um desejo ancestral meu. Taí o resultado. Um grande abraço de domingo chuvoso.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

A Louca (1994 - 2004)

Essa imagem originalmente era a foto de uma mulher querendo sair de algum lugar. A foto foi mergulhada em parafina. Estava definitivamente, ou quase, aprisionada, até o dia em que fotografei o trabalho e o arrebentei na sacada da minha casa.
A loucura nos aprisiona pelo olhar do outro que nos diagnostica, julga, classifica: é louca. Assim, qualquer argumentação sua, qualquer pensamento ou discurso perdem a validade. Afinal de contas, ela é louca, eu sou louca, nada do que digo tem nexo, sentido, valor de realidade ou verdade. Jamais deve ser levado em consideração. Perde-se o respeito mínimo de um outro, quando ele faz um gesto com o braço e exclama: "Deixa pra lá, é louca."
E com isso condenamos os loucos ao silêncio, condenamos os loucos a falarem somente com o céu, a terem respostas exclusivas do vento.
A arte me salvou. Classificando a minha loucura como arte, ela ganhou um espaço de credibilidade nessa sociedade doente e perversa.
E depois, dizem que a louca sou eu. E eu não vou calar a boca não.

Aquarela sobre Pedra e Mar (1991)

Minha primeira exposição, em duas etapas: Usina do Gasômetro e Casa de Cultura Mário Quintana, Porto Alegre. São fotos P&B trabalhadas em laboratório e posteriormente pintadas com aquarela. Uma delícia de fazer.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Pedidos para o livro "Eu não Entendo"

O livro "Eu não Entendo" consiste em dois volumes de fotopoemas: Volume Horizontal e Volume Vertical. Sua encadernação artesanal foi feita com a técnica de concertina (sanfona), e capa de tecido. Acompanham o livro pequenos grampos, permitindo a opção de pendurá-lo onde quiser. Seu tamanho fechado é 13,5x8,5 cm e aberto 13,5x74 cm. Seu conteúdo pode ser integralmente visualizado clicando aqui. Espero que gostem, porque eu adorei fazer, pensar, planejar e já estou com a cabeça no próximo. Tudo com muito amor.
Cada volume sai por R$ 18,00, e os dois juntos custam R$ 30,00. Mais o correio. Os pedidos podem ser feitos através de um comentário, ou através de meu e-mail: ganizinha@yahoo.com.br.

Eu tô muito feliz, só me falta agora ter um filho, mas... já era. Árvore e livro, feitos. Um grande abraço

Champanhe com Manga (1994)

"Champanhe com Manga" foi uma exposição que fizemos - Cibele Vieira, Amalia Creus e eu - na Casa de Cultura Mário Quintana, em Porto Alegre. Ui, bons tempos de faculdade...

Xamã

Retrato de Fran Paterno

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Os ovos (2007) - para a Bel

Adoro terapia. A legitimidade pura e legalizada de falar de mim. O tempo absoluto daquele tempo programado. Uma delícia. Análises, insights, aprendizados, sustos e alguma surpresa. E é uma dessas que conto aqui:
- Vamos fazer um exercício?
- Tá, vamos...
- Você escolhe o animal que mais gosta e o que menos gosta...
- A galinha.
- Como?
- A galinha. É um bicho que só serve pra virar prato. Na mesa. Nem precisa garfo e faca.
- Ta, ok. E o quê você não gosta na galinha?
- Gosto da galinha, mas no prato, frita, cozida, risoto, assada. Mas é feia, quando fica de pernas pro ar. Viva, corre sempre pro lado errado, alvoroçada. Até o cocorocó é feio pra burro.
- Mas, tem o lado legal também...
- É uma delícia de devorar e ainda sobram uns ossinhos pra dividir com a cachorrada. E tem os ovos que ela põe. Isso é legal, além de proteger os pintinhos embaixo das asas. É engraçado.
- Humm, nesse exercício você se vê como uma galinha que corre sempre pro lado errado e tem um som feio.
Deu água nos olhos. Não controlei a idéia de parecer uma galinha. Olhei infeliz e ouvi:
- Mas você tem os ovos! VOCÊ TEM OS OVOS!!!

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Bodas de Ouro mais 1

As bodas de ouro dos meus pais foi no ano passado. Fizemos uma festa íntima, linda, feliz. Este ano eles festejaram a sós. E como eu não tinha blog no ano passado, bem, tá aqui a lembrança de tudo. A restauração das fotos ficou por minha conta... deu mais ou menos um meio século de trabalho...

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Dia

Hoje foi um dia muito feliz. O primeiro banho de lagoa depois do inverno. Caminhamos por "nossas" trilhas, os cachorros soltos juntos e contentes, as árvores de sempre, as flores, as borboletas, as mutucas... A Lagoa nos saudou com quietude, um bezerro dava coices no ar, e os morros que abraçam a Lagoa pintados de amarelo dos guarapuvus em flor. Segunda de manhã, tudo vazio. Dispensamos biquinis e maiôs e mergulhamos feito crianças correndo e chutando a água doce e limpa. "Estou em casa", pensei. Não tinha saudade, nem entrei em euforia. Era simples e pura a alegria e a familiaridade da "nossa" praia preferida. Um pouquinho de Tai Chi e não podíamos mais aguentar as mutucas e mosquitos. Simplesmente perfeito.

Al Holst

Ah, meu amado amigo Alemão... finalmente terminei o seu retrato e, olha, tá a sua cara.
Um abraço gigante.

domingo, 9 de novembro de 2008

Xangô, meu bom senhor

Letras.mus.br

Nação Zumbi e o Canto de Xangô

Eu vim de bem longe
Eu vim, nem sei mais de onde é que eu vim
Sou filho de Rei
Muito lutei pra ser o que eu sou
Eu sou negro de cor
Mas tudo é só o amor em mim
Tudo é só o amor para mim
Xangô Agodô
Hoje é tempo de amor
Hoje é tempo de dor, em mim
Xangô Agodô

Salve, Xangô, meu Rei Senhor
Salve, meu Orixá
Tem sete cores sua cor
Sete dias para gente amar

Mas amar é sofrer
Mas amar é morrer de dor
Xangô meu Senhor, saravá!
Me faça sofrer
Ah, me faça morrer
Ah, me faça morrer de amar
Xangô, meu Senhor, saravá
Xangô Agodô

sábado, 8 de novembro de 2008

Créditos do Volume Horizontal de "Eu não Entendo"

É. A Helen está fazendo as capas, o miolo está na impressão e eu estou feliz da vida de ter terminado alguma coisa. O que mais me encantou é que nesse processo cansativo, prazeroso, onde me esforço para que tudo fique perfeito nos mínimos detalhes, inclusive na imperfeição, o mais gostoso é perceber o quanto tudo ao nosso redor faz parte de tudo que faço. Cada lua cheia, cada pessoa que se deixa fotografar, cada pessoa que influencia com seu silêncio ou com suas palavras, ou com seu abraço. Cada bichinho (ontem, meu gato Tuti Tutankamon estilhaçou a minha mesa de vidro), cada grito de pássaro, borboleta esvoaçante, brisa, onda, pomba na praia, pedra quente pra se deitar ao sol, baleia e seu filhote. Cada árvore e cada flor. Só um suspiro já é suficiente. A autoria é mais uma ilusão. Os agradecimentos "oficiais" dizem respeito as influências conscientes. Considero "Eu não Entendo" como um compêndio de vivências, uma colcha retalhada de associações livres, entre imagens e texto. Olha, a todas as pessoas que conheço, que me fizeram bem, que me fizeram mal, ou ambas as coisas, o meu muito obrigada. Querendo ou não querendo, gostando ou não gostando, vocês fazem parte desse pequeno trabalho. Que tá lindo. E é só o primeiro.

Créditos do Volume Vertical de "Eu não Entendo"

Última página de "Eu não Entendo", yes!

Lá vem o cisne, patati...

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Correição

Correição é um fenômeno que acontece principalmente na época de muita chuva, onde as formigas de uma determinada espécie, por falta de alimento e casa seca, decidem se mudar para encontrar um novo lar. É impressionante. São milhares de formigas pretas relativamente grandes passando por tudo e arrasando com plantas, migalhas, insetos e o que encontram pela frente. Ano passado passaram dias pela trilha em frente a minha casa. Ocuparam toda a largura de metro e meio da trilha. Para sair de casa era necessário dar pulos sobre elas, pois na tentativa de caminhar, subiam pelas calças, pernas, saias e era um tal de tapa tira formiga daqui, tira formiga de lá. Nos sentíamos num jogo de amarelinha mata formiga, não tinha outro jeito.
Este ano, elas decidiram passar por dentro da minha casa. Meus gatos e eu ficamos surpresos com aquela trilha de formigas carregando ração de gato e acabando com meio pão de mandioca que deixei desavisadamente em cima da mesa.
Toda noite elas voltam e carregam mais um tanto de ração. Nunca o chão de minha casa esteve tão limpo. A natureza não é maravilhosa?

"Eu não entendo" - Eco

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Suspiro (2000)

Acredito em Zeus e sou fã de Vênus e Posseidon.
Acredito nas Ninfas e nas Cibeles, no oráculo de Apolo.
Acredito na Deusa Ísis, em Thor e sua turma.
Acredito na Grande Deusa, na Visão das Sacerdotisas e nos Druidas.
Acredito em Oxalá, Exu e sou devota de Iemanjá.
Acredito em Buda, em Tupã, na Iara dos rios.
Danço com Krishna, bebo ayahuasca, encontro meu animal de poder.
No Saci Pererê, na Mula-Sem-Cabeça e no Curupira,
eu acredito também.
Acredito em anjos, fadas, sereias, gnomos e duendes.
Na natureza que é, sem valores nem crenças.
No espírito da pedra, do fogo, da água e do ar.
Rezo o Pai Nosso e recebo o Okiomi.
Acredito no continente perdido de Atlântida e na sabedoria do povo Maia.
Acredito nos que moram nas Plêiades e na constelação de Orion.
E sou tudo isso pelo motivo mais simples: acho bonito demais.
Não sou humanista, sou pela vida, pelo direito pleno de viver de todos os seres: homens, animais, plantas, chuva limpa, rios e mar sem lixo.
Sou, antes de tudo, pela paz, pela poesia, de peito aberto, pelo profundo respeito a todas as diferenças.
Eis a largura do meu suspiro.

Ah, Francisquinho

Quando minha primeira sobrinha nasceu...

...foi tanta a nossa alegria. Meu irmão não se aguentava. Com sua mão gigante segurava a pequena Aninhari como um trofeuzinho delicado. Não parava de sorrir. Eu, estupefata com aquela coisinha minúscula que de tão embrulhada, só se via os cachos de cabelos pretos e fartos. Lembro que arrumei um buquê de rosas e saí distribuindo pelo hospital afora, compartilhando esse acontecimento que, por um bom tempo, fez nossa família esquecer ou deixar pra lá suas divergências e problemas.
Mas hoje, o dia em que você está fazendo 20 anos, a pequena loirinha encacheada Aninhari, é uma mulher alta, com sua beleza particular, com seu coração de ouro e sonhos de uma vida, e que me ensina, entre coisas ótimas, a ser tia. De Ana Rita chamo Anari, por causa do sorrisão amoroso, sempre presente. Sempre um presente.
A gente adivinhou, Anari, que você em nossas vidas seria, é e será tudo de bom. Obrigada.
Com amor, feliz aniversário
Tiagani

A Fada (ou sobre a plenitude do amor) 2005

Não que eu queira que me dirijam a palavra como louca, ou mesmo como lunática. Não, senhoras e senhores. Desejo antes de tudo contar uma história de amor. Que me transformou na mais plena de todas as criaturas. Essa história, senhoras, é um apelo e uma esperança a todos os corações sedentos. E creiam, senhores, o que conto agora é a mais pura verdade.
Estava na minha paz, matando a sede com uma água da Velha do Coco, no centrinho da Armação. Distraída pelo mar, súbitas cosquinhas me fizeram espirrar. Olhei para minhas roupas e logo reconheci o pó dourado jogado sobre mim. Senhoras e senhores, era o velho pó de pirlimpimpim. Virei na direção da mulher que o soprou.
Estudei a vida inteira seres encantados, mas não tinha visto unzinho até aquele dia. Ela, a Fada. Da minha altura, com suas orelhas pontiagudas, cabelos brancos, olhos cinza cintilantes e asas de borboletas azuis. Acenando discretamente para mim. Mantinha a prudente distância de 20 cm do chão, flutuava e dançava suavemente um convite a segui-la.
Senhoras e senhores, nenhuma surpresa eu senti. Pelo contrário, uma familiaridade e uma paz sonhada na alma deram rumo aos meus pés. Seu movimento elegante de princesa sonhadora e sorriso de menina me dominou.
Fui atrás desta Fada com calma e alegria singela pelas vielas da cidade, a observar seus ombros largos e mãos fortes. Vez por outra virava para trás, garantindo sua sedução pelo olhar. Nada podia fazer, senhoras, a não ser persegui-la delirante e enfeitiçada.
Sabia-me encantada, senhores, e meu olhar fixo temia perdê-la em alguma bruma desconhecida. Mas foi numa trilha mágica, entrando pela mata selvagem do Morro do Matadeiro, que me percebi radiante. Estava voltando para casa, era tudo que meu coração pedia.
A Fada, estonteante e delicada, finalmente parou. Sentou-se em um tronco milenar de um guarapuvu. Olhava sensível e amorosa à espera de minha aproximação. Magnetizada, senti ainda o perfume da flor dama da noite a anunciar os próximos momentos. Não quero deixar de surpreendê-los, senhoras e senhores, mas o que podia passar-se como óbvio, não o foi.
Minha Fada sublime, de beleza única, sussurrou com uma voz rouca e gravemente masculina meu nome. Tirou o vestido tímido e vi seus seios perfeitos. Com o olhar mais intenso ainda, deixou à mostra seu pênis lindo, pronto para o amor.
Desde esse dia nunca mais nos separamos, senhoras e senhores. Encontrara meu sonho de criança e adulta, o amor de minha eternidade, a alma que buscara incessante em uma forma majestosa, rica e delicada. Mas não se enganem, meus amigos, essa história não fala de corpos e matéria.

Fala de almas que contém o estranho invisível e que um dia, compreendidas e amadas, vão ser.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

domingo, 2 de novembro de 2008

Res piração

Sim,
você me inspira.
Sim,
você me pira.

Da pele: do livro "Eu não entendo"

O desenho é da Helen Ferreira, valeu!

sábado, 1 de novembro de 2008

O pé de repolho (2005)

Primeiro sabadão do mês, rancho, aquele megasuper lotado, começo a vistoria de preços pela paisagem de embalagens e produtos promissores. Sonolenta. No primeiro corredor, olha só, tudo que não precisava encontrar. Fernanda a escolher um creme hidratante “ninguém embrulha você”. Para confundi-la, saio pela esquerda e pego a rua dos produtos de limpeza e... céus! Ricardo pegando um tira manchas “é bom 3 vezes”. Outro ex? “Essa não”, pensei, virando o carrinho em 180 graus. Fugindo pelo corredor das ferragens - meu predileto - o paraíso das formas estranhas e, puuuts! Vejo Miranda concentrada em um produto para carros “ajuste a vela”. Cheia de regras. “Tudo bem”, falei sussurrando, “ainda bem que é um mega espaço”. Passo então para o setor de verduras e... Tiago está lá, na banca de frutas “ação contra o tédio”. Ai, ai, ai, mais um ex-fucking guy que não quero ver, falar, pensar sequer! Me escondo atrás de uma pilha de batatas e quando vejo tudo vazio, saio de fininho direto para o açougue. Imagina se não estava lá Adelaide, olhando para uma picanha “eu quero você”. Adelaide que não me quis mais. Disfarcei na fila e antes que me visse, fujo para a confeitaria, derrubo uma pilha de latas de coca cola e vôo até os eletrodomésticos. Respiro fundo e, cacete! Lá está Federico fascinado por um aparelho de som “mais potência”! “Não quero nunca mais olhar pra sua cara”, gritei no nosso último encontro. Viro pelas toalhas baratas que duram um banho só e surpresa! A consciência culpada viu Margarida segurando lençóis de algodão “como andar no ar”. Giro com pressa e uma criança imita atrás de mim: “vrummm, vrummm”. Tive que rir e decido, corajosamente, a fazer minhas compras, afinal, sou adulta e civilizada. Que se danem meus ex-casos, embalagens e produtos promissores. Mal entro no próximo corredor e a coragem desaparece. Vejo Tiago “ação contra o tédio”; dobro a outra esquina e dou de cara com Federico “mais potência”; finjo olhar as prateleiras, distraída, me volto para o lado oposto e passando pelo corredor perpendicular, Margarida “como andar no ar”. Pego o outro lado, entro em qualquer corredor sem saber do que se trata e lá está Adelaide “eu quero você”. Apressada e na única direção possível, atrás de uma promoção de extrato de tomate, quem vislumbro? Sim, Ricardo “é bom três vezes” pegando um saco de carvão. Entro de novo à direita, vou de manso até o fim, páro, olho para os dois lados. Ninguém, ufa! Sigo em frente, viro à direita e... ai! Fernanda “ninguém embrulha você” conversando com Miranda “ajuste a vela”! Decido dar a volta, mas, caramba! Novo corredor, Adelaide; mais uma estante, Margarida; nova escolha, Tiago; pães de trigo, Ricardo; escovas de dente, Fernanda; cds de MPB, Miranda; aspiradores de pó, Federico. Correndo pelo então minúsculo mercado, Margarida, Adelaide, Federico, Fernanda, Miranda, Ricardo, Tiago; Federico, Miranda, Ricardo, Margarida, Tiago, Adelaide, Fernanda. O caixa rápido, cadê o caixa, rápido!!!
Chego suando e ouço a voz monótona da moça:
- Só o repolho?
- Só - respondo distraída, contando as moedas de minha salvação – só o pé de repolho.

Boêmios, meus Boêmios

"Vocês nasceram para tocar uns com os outros", exclamação minha "in vino veritas"Helen FerreiraBeto LaudaDanilo Brito
Mark Santos
Fotografei todos os shows dessa galera linda