controvérsias

"A cada mil lágrimas sai um milagre”

Alice Ruiz

sábado, 24 de janeiro de 2009

A voz de Gupimpa

A chata da turma. Sim. Desde criancinha. Era eu. Com minhas orelhas pontiagudas, meu jeito transparente, meu chapéu vermelho e um tamanhinho. A primeira da fila. Detestava a escola. Gostava do recreio. Tinha uma pequena mata de eucaliptos com quem conversava todos os dias. E uma paineira gigante doída de velhice. Só que nunca escutava a sirene de término do recreio. E todos os dias a professora olhava seriíssima quando eu tentava entrar despercebida. Por causa desse meu jeito, era a chacota da turma. Por causa das minhas palavras, incompreensível, ficava sozinha. Na hora do teatrinho infantil, eu era chamada pra fazer a bruxa. E eu fazia. Mas de raiva, fazia linda, com vestido azul do céu, fita na cabeça, brilhos prateados e a varinha de condão com uma estrela na ponta. Quando me perguntavam que raio de bruxa eu era, explicava:
- Sou uma fada má, não uma bruxa.
E era. Uma fada. Nem má, nem boa e muito menos com varinha de condão. De chapéu. Vermelho.
Mas, as coisas mudam. E como mudam. Saída da escola quis ser diferente. E fui. Comecei a falar de um jeito que me entendiam, comecei a treinar a simpatia. Fui dando jeitos em tudo, menos no visual. Ah, eu amo minhas roupas rasgadas com cheiro de mato.
De tanto que quis, virei popular. Onde ia todo mundo gostava de mim. E eu ria, e ajudava, e conversava, e ria. E todo mundo adorava. Quase fiquei feliz. Tinha esperança. Mas um dia, por sinal um lindo dia, não quis mais. Encontrei outra fada. Achei que podia e era hora. De contar quem eu era.
Eu era e ainda sou. A chata da turma.

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